O Que é Que um Engenheiro de Software Realmente Valoriza: uma Abordagem Bottom-Up

Se já leu sobre o que Tech Leads e CTOs têm a dizer sobre o que os seus engenheiros valorizam num emprego, talvez tenha chegado o momento de conhecer a perspetiva honesta de alguém que é, ele próprio, engenheiro de software!

A mudança do trabalho de escritório para o trabalho remoto, tem vindo também a mudar a maneira como as empresas gerem o seu pessoal. Ou pelo menos, deveria.

Os mercados financeiros têm forçado as empresas a acompanhar este desafio de forma mais rápida e precisa, antes que seja tarde demais.

Neste artigo vou falar de liderança, fugindo da típica abordagem top-down, já abordada no nosso blog nos artigos seguintes:

Através de uma abordagem bottom-up, e seguindo a estratégia “dividir para conquistar”, focamo-nos num dos mais importantes recursos que uma empresa de tecnologias detém: os seus engenheiros.

Os engenheiros e as suas equipas são uma peça indispensável do puzzle a que chamamos empresa. Entender e saber gerir as necessidades desses trabalhadores é a chave para a gestão de um bom negócio, atraindo também novos colaboradores.

A base da produtividade, está na felicidade e positividade” – Miguel McKelvey

O Que Procura Um Engenheiro de Software? 

Como engenheiros de software, temos a sorte de ter o mercado a nosso favor. Já que cada vez mais empresas investem em elementos tecnológicos como websites, aplicações internas, ou outros produtos relacionados, a capacidade de trabalho acaba por não ser suficiente para cobrir todas essas necessidades.

Tendo estes pontos em consideração, podemos ser mais exigentes em relação ao que procuramos. Caso contrário, fazer uma entrevista e começar um novo trabalho é uma questão de semanas.

A taxa de retenção de engenheiros nas empresas é um dos grandes desafios com que muitas empresas se deparam. Todos sabemos que perder um trabalhador para outra empresa, e, consequentemente, iniciar um processo de recrutamento e posterior onboarding, tem custos associados (qual o verdadeiro custo de perder um trabalhador? Descubra neste artigo). Se o seu foco principal é desenvolver o negócio, é essencial evitar ter de entrevistar, analisar candidatos e fazer o onboarding das novas contratações a cada duas semanas.

Do ponto de vista de um engenheiro, os tópicos abordados de seguida, são alguns dos objetivos a alcançar ao aceitar uma nova proposta.

Salário

Eu sei… todos queremos receber cada vez mais!

Para um engenheiro, isso não é exceção. Queixamo-nos constantemente dos nossos salários aos nossos colegas, apesar de recebermos muito melhor que em outras áreas ou funções.

Uma das maiores pedras no nosso caminho é a falta de progressão – quando uma empresa não detém um sistema de crescimento e progressão de carreira, ou por outras palavras, uma linha de crescimento acompanhada por um salário correspondente.

Porque é que alguém haveria de desejar melhorar as suas competências se isso nos mantiver no mesmo estatuto salarial? Todos sabemos que conhecimento é poder, e que o dinheiro não deveria ser o principal fator a guiar-nos ao topo. No entanto, a verdade é que, ser monetariamente recompensado por um aumento ou um bónus, será um fator significativo quando surgir a oportunidade de seguir em frente.

O nível de desempenho e senioridade deverá estar sempre alinhado com uma determinada banda salarial e é determinado em função de avaliações sazonais determinadas pela empresa. Quando um engenheiro é posicionado num determinado nível, este nível irá transparecer o seu desenvolvimento salarial e de carreira.

Podemos descrever este processo como uma espécie de gamificação, onde quanto melhor o seu desempenho melhor a recompensa.

Quem é que não quer receber mais dinheiro?!

Projetos Interessantes e Desafiantes 

É fácil odiar segundas-feiras quando não gostamos do que fazemos. Da perspetiva de um engenheiro, não gostar de um determinado projeto pode estar relacionado com diversos tópicos:

  • Tecnologia > Linguagens em desuso, frameworks antigas, ou até pode ser uma tecnologia super recente mas apenas não estar alinhada com os objetivos de desenvolvimento do profissional.
  • Apenas mais um > Quando trabalhei no setor dos seguros, a maioria das aplicações que nos propunham desenvolver incidiam maioritariamente sobre a utilização pessoal do cliente ou projetos de migração. Mesmo quando a tecnologia despertava o meu interesse, o dia a dia era repetitivo: migrar a lógica de um produto para o outro, entregar e corrigir eventuais problemas.
  • Dinheiro vs Estratégia > Contas feitas, o que interessa é o negócio. As receitas vão ser sempre a prioridade, independentemente da opinião de cada um. No entanto, as empresas precisam de considerar dois fatores, a receita que um dado projeto irá gerar… e a felicidade de quem o está a desenvolver. Será que vale a pena favorecer um em relação ao outro?
  • A adaptação é nossa, não do cliente > Em projetos onde trabalhei, o desenvolvimento do projeto era normalmente desenvolvido com um acompanhamento constante do cliente. Juntos através de sessões de retrospetiva, entre outras, como levantamento de problemas e/ou aprovação de calendário, levávamos o projeto para a frente.


Contudo, quando o cliente demonstra dificuldades em como agir, ou vai contra a nossa maneira de trabalhar, devemos ser os primeiros a alertar. Não devemos esperar que o cliente conheça a nossa metodologia, ou que a siga desde o início. É da nossa responsabilidade ensiná-lo.

Infelizmente, já experienciei em muitos projetos este cenário, onde ninguém assumiu esta responsabilidade, forçando a equipa a colaborar com os “conhecimentos” e “procedimentos” definidos pelo cliente. Levando maioria das vezes o projeto a um estado de desorganização total.

Todos sabemos como isto acaba, certo?

Falta de Recursos

Parece razoável que o empregador providencie os recursos necessários para que um engenheiro possa fazer o seu trabalho, certo? No mundo real, nem sempre é assim tão razoável. Infelizmente, e por mais difícil que seja acreditar, apenas na terceira empresa em que trabalhei tive a oportunidade de ter acesso a todos os recursos que preciso para tirar melhor partido das minhas capacidades de trabalho.

De uma forma geral, um portátil adequado, sem atrasos de resposta, e um infra-estrutura fácil de usar, que permita evitar correr uma maratona para atingir os objetivos.

Tive de pressionar os responsáveis e a equipa de administração de sistemas múltiplas vezes, e lhes fazer entender que, a não atribuição de bons recursos aos trabalhadores, limitava as suas qualidades e capacidades de trabalho.

Não deveria ser uma situação vantajosa para os dois lados?

Espírito de Equipa


Confie em mim quando digo que estas são verdadeiras dificuldades que eu, e muitos conhecidos, amigos e colegas engenheiros, passaram ao longo das suas carreiras.

Aquilo que me fez sentir realmente triste e duvidar se estava na empresa certa, foi trabalhar com pessoas que não sentiam a necessidade de serem melhores engenheiros.

  • Porquê aprender novas técnicas se as que tenho já me permitem fazer o meu trabalho?
  • Porquê avaliar o que correu mal durante a fase de desenvolvimento se apenas tenho de me preocupar com o meu trabalho?
  • Porque é que eu haveria de sugerir melhorias se ninguém quer saber?
  • Porque é que haveria de seguir sugestões se me sinto confortável com os meus métodos de trabalho?

Muitas perguntas e muito poucas mudanças. À primeira vista, podemos pensar que não se trata de um problema nosso, contudo acredito vivamente que mudar estas mentalidades é responsabilidade de todos.

  • A equipa de recrutamento deveria filtrar que tipo de pessoas se encaixa melhor no perfil e cultura da empresa. Qualquer pessoa que não cumpra os requisitos pode levar a conflitos no futuro.
  • O responsável de produto deveria expor o comportamento esperado dos membros da equipa, desde o primeiro dia. Quando novas pessoas se juntam ou mesmo quando os próprios membros se esquecem dos princípios estabelecidos, estes deveriam ser relembrados – como? Por exemplo, através de atividades de team building.
  • O arquiteto do projeto deveria promover os padrões de qualidade do projeto, pedindo sugestões e revisões constantes relativas à atividade e ciclo de desenvolvimento, apelando à iniciativa.
  • Cooperação deve ser uma constante entre colegas, encaminhando a novos caminhos e novas possibilidades de progressão de carreira.

Formação

Quando trabalhamos para alguém que disponibiliza um orçamento ou sessões internas para te ensinar novas competências com frequência, significa que está a ser feito em ti um investimento a longo prazo.

Ao trabalhar na área das tecnologias, conseguimos facilmente observar a velocidade de desenvolvimento e crescimento deste setor, não acompanhar as novidades que vão surgindo apenas levar-nos-á a ficar para trás rapidamente.

Se nos derem as ferramentas necessárias para acompanhar essa evolução, indiretamente o negócio irá valorizar com o passar do tempo, assim como as competências dos trabalhadores. 

Sem dúvida que será uma vantagem para ambos os lados!

Transparência

Como podem as palavras ter tanto impacto nas pessoas?! Felizmente no passado, tive sempre a oportunidade de trabalhar de perto com membros da direção com poder para influenciar o caminho que a empresa iria tomar.

Como engenheiro, tópicos como salários, equipamento e desenvolvimento de carreira, são bastante relevantes. Por vezes, deparei-me com decisões da direção incoerentes com a cultura da empresa e para as quais não houve uma explicação ou justificação. Ou se houve, a mesma foi pouco credível.

Algumas explicações apenas me suscitaram dúvidas relativamente ao quanto eu deveria confiar naquela empresa. Será que somos mesmo a família que dizem sermos, ou somos apenas mais uma empresa como qualquer outra?

O Balanço que Devíamos Tentar Alcançar



Acredito que, enquanto engenheiro de software, devemos sempre tentar encontrar um balanço entre o nosso próprio bem-estar e o empenho que pomos no nosso trabalho.

Cada tópico mencionado na secção acima tem a sua importância na altura de decidir entre uma nova proposta de trabalho ou o sítio onde se está a trabalhar atualmente. Tendo isso em consideração, reforçar a sua estratégia de retenção tendo em conta os pontos mencionados poderá valer-lhe horas e muito dinheiro poupado em recrutamento que não teve que fazer.

Sabemos que há pontos mais facilmente trabalháveis que outros. Investir em educação, aprendizagem de novas tecnologias e aperfeiçoamento de soft skills pode ser mais fácil de concretizar, do que aumentar o salário, por exemplo, o que faz deste um bom ponto de partida.

Para reforçar, a transparência pode fazer derrubar aquele sentimento que nada vai mudar ou que ninguém quer saber. Uma comunicação que siga esta via é vai ajudar os seus colaboradores a identificar-se com a empresa mas também o vai ajudar si – ao ser transparente é mais provável que também o sejam consigo.

O Que é Que um Engenheiro de Software Realmente Valoriza – Considerações Finais

Espero que este artigo tenha sido descritivo o suficiente para o fazer acreditar que a retenção é possível e desejada para ambos os lados, empregador e colaborador.

Enquanto engenheiro que tem tido a oportunidade de experienciar todos os pontos acima mencionados, assim como conhecer alguns colegas que passaram pelo mesmo – qual o valor da minha experiência? Uma visão bottom-up que poderá ilustra os pensamentos e sentimentos da sua equipa e relativamente ao seu trabalho.

Enquanto líder de equipa ou CTO, então está nas suas mãos tomar uma posição quanto à importância que é colada na estratégia de retenção da sua empresa, usando este conhecimento,

Lembra-te que, o salário é algo com o qual nos preocupamos uma vez por mês, mas no dia dia, o que queremos é ser incluídos, respeitados e sentir entusiasmo pelos desafios que nos esperam!