TVs e Nearshoring

Por muito que falemos sobre experiência e cultura, não há nada como ouvir as pessoas que trabalham connosco. Por isso, queremos partilhar essas mesmas experiências no nosso blog! Hoje temos connosco o Vitor Fernandes, developer na KWAN em regime nearshoring.

Olá Vitor! Comecemos pelo mais fácil! Quem és e o que fazes?

Chamo-me Vitor Fernandes, sou developer desde que comecei a trabalhar e tenho a sorte de fazer aquilo que gosto.

Mas nem sempre foi assim. Na realidade, a informática surgiu já tarde e por linhas tortas. No secundário fiz um curso técnico-profissional de Contabilidade e Gestão e quando chegou a altura de escolher os cursos universitários, tinha Gestão e Economia primeiro, e lá para o fundo da lista também tinha uma opção de Informática de Gestão.

Felizmente, as provas de acesso não correram nada bem e não consegui ter acesso a nenhum deles.

De modos que acabei por me inscrever no ensino privado e fiz a licenciatura em Informática de Gestão no Instituto Superior de Gestão e ai foi o primeiro contacto mais sério com o mundo da informática. A programação era uma coisa quase natural, “fácil” para mim.

Desde os 10-12 anos que sempre tive curiosidade com os computadores, os clássicos Timex 2048 e ZX Spectrum, o meu primeiro foi um ZX Spectrum 2+, mas isso era só para diversão.

O primeiro PC foi um 486 e custou à volta de uns 2.000 euros – uma brutalidade. Tinha um botão de turbo que nunca percebi para que servia, para mim estava sempre ligado, para que é que alguém iria querer o computador mais lento?

Sou uma pessoa calma e reservada, introvertido, um INTJ em termos de testes de personalidade, para o bem e para o mal. Nos tempos livres interesso-me pela maioria dos temas tecnológicos, tento acompanhar os meetups que se vão realizando em Lisboa e conhecer coisas novas.

Como tem sido o teu percurso profissional?

Os primeiros 2-3 anos a seguir à universidade passaram rápido, trabalhei numa instituição de crédito, onde participei no desenvolvimento de uma solução de pré-contencioso. Foi engraçado observar as pessoas todas do contact center e os malabarismos que faziam para contactarem com as pessoas com prestações em atraso – desde ligar para os vizinhos a enviar faxes para o emprego. Era uma equipa unida e com um espírito alegre, mesmo passados quase 20 anos, ainda tenho saudades deste período.

A seguir integrei uma equipa que estava a desenvolver o sistema usado para a gestão de stocks das fragatas da marinha portuguesa, o projecto já durava há uns quantos anos, com uma equipa à maneira antiga, analistas funcionais, DBA, programadores, waterfall, especificações que duravam meses antes de se escrever uma linha de código, e foi uma travessia do deserto. Em 2 anos acho que só participei no desenvolvimento de um projecto durante uns meses, o resto do tempo foi gasto em formações para um projecto que nunca se chegou a concretizar.

Depois disso, trabalhei numa startup desde o inicio, onde participámos no projecto de implementação pioneiro da TV interactiva original da Tv Cabo. Aqui fiz de tudo, desde espalhar cabos, desempacotar servidores, configurar ambiente de desenvolvimento, investigar a tecnologia com documentação reduzida, experimentar de tudo para conseguir ter alguma coisa a funcionar. Acabei por fazer a customização do UI do sistema da Microsoft que era usado nas set-top boxes, mas o projecto nunca foi bem aceite pelos clientes finais e nunca teve lançamento comercial. Era demasiado cedo e com demasiados constrangimentos, o sistema era lento, a velocidade das ligações internet era lenta, a caixa era gigante e fazia barulho, era um autêntico PC com ventoinhas e tudo.

Acabei por mudar mais uma vez, para outra startup da mesma área, e passados uns meses, o projecto foi cancelado. Acabámos por encontrar um nicho no desenvolvimento de soluções para o infografismo para televisão. Mais uma vez tive que implementar projectos com pouca documentação disponível, quase de investigação, para se conseguir concretizar qualquer coisa. Foi um mundo novo, finalmente conseguia mostrar às pessoas o que é que eu fazia, bastava ligar a televisão. Mas também tinha o lado negativo, com a televisão em directo, qualquer problema era imediatamente evidente, não era possível voltar atrás e corrigir, já tinha acontecido.

Foram 13 anos intensos e sempre com coisas novas a acontecer.

Qual o projecto em que mais gostaste de trabalhar?

Gostei muito de participar na produção dos concursos televisivos, é um ambiente interessante, sempre com desafios a resolver para se conseguir fazer as gravações. Permitiu-me também mexer com ligações eléctricas, botões, controlo de iluminação e integrar esse mundo analógico com as soluções informáticas que fomos desenvolvendo.

Mas o projecto que mais me orgulho foi a implementação do sistema de infografismo e integração com o sistema de redacção dos canais SIC e SIC Notícias. O infografismo era produzido manualmente, com recursos a dois ou três sistemas diferentes, em que os jornalistas escreviam os nomes e frases que queriam durante as notícias, e depois os operadores tinham que digitar tudo outra vez. Eram necessárias 2 pessoas que começavam a preparar o jornal da noite com duas horas de antecedência para conseguir ter tudo pronto a tempo. Com o sistema que desenvolvemos, todo este trabalho foi automatizado, passou a ser possível ter tudo pronto no espaço de minutos. Acho que acabou por revolucionar os jornais, permitiu a publicação de muito mais gráficos, de frases de última hora, hoje é praticamente possível perceber uma notícia sem som, só lendo os conteúdos gráficos.

E a parte que considero mais importante, tínhamos uma operadora já com anos de experiência, no canal desde a fundação, mas sem grandes conhecimentos de informática, tivemos que dar formação a toda a gente, incluindo coisas básicas, como gravar ou abrir um ficheiro. No dia do lançamento, toda a gente estava nervosa e era ela a operadora que ia fazer o jornal. Acabou por desistir a meio, teve que ser substituída, com o director aos berros. Mas ao fim de uns dias, já estava a operar com o sistema, e ainda hoje faz o seu trabalho normalmente e com qualidade. É uma das coisas que me orgulho, ter sido capaz de criar um sistema que não só resolveu um problema mas que rapidamente pode ser aprendido por qualquer pessoa.

Tens algum momento que te tenha marcado durante o teu percurso?

Tenho uma história de trabalho que me marcou ao longo dos anos. Quando começamos a fazer o infografismo dos jogos de futsal da liga portuguesa, foi logo no inicio, talvez já há uns 10 anos atrás, das primeiras transmissões desportivas em que participei, ainda viajávamos com as equipas técnicas para ligar os equipamentos e dar suporte aos operadores que ainda estavam a aprender o sistema, um dos operadores ficou doente no dia da viagem, íamos para o pavilhão da UTAD e em cima da hora não se conseguiu encontrar um substituto. Fiquei eu a fazer o lançamento do infografismo do jogo, coisa que nunca tinha feito antes. Correu muito mal, não tinha noção dos tempos da emissão, dos planos televisivos, o realizador já desesperava comigo, falhei tantos gráficos nesse dia… Mas no final, lá acabou por ficar tudo perdoado, como é habitual nestas transmissões. Todos falham de vez em quando, e apesar das barbaridades que se dizem durante as transmissões, no fim são todos amigos na mesma. Mas fiquei marcado para sempre, desde aí que nas transmissões das eleições, por exemplo, faço tudo por tudo para não operar os gráficos, os dedos tremem, prefiro ser responsável pela actualização dos resultados, coisa que assusta os outros.

E acabei por desenvolver uma outra sensibilidade para perceber os problemas dos utilizadores das nossas soluções, por vezes coisas que para nós programadores são insignificantes ou não fazem sentido tem grande impacto na forma como usam o sistema, a posição de um botão, uma tecla de atalho, o tamanho da letra, coisas que agora se chamam UX.

Em que estás a trabalhar agora?

Estou a trabalhar num projecto de uma startup americana. Estamos a acabar de implementar um MVP para poder então dar acesso ao público em geral. E mais não posso dizer 😉

Toda a equipa de desenvolvimento é remota, sou eu em Portugal, 2 developers russos, 1 designer búlgaro, 1 QA romeno, 1 designer americano. Felizmente a diferença horária entre nós não é muito grande, são mais 2/3 horas na Rússia, o que nos permite fazer daily meetings através do Skype e ter sempre o Slack aberto para qualquer questão urgente. Como a equipa toda é remota, não há grandes esquecimentos de comunicação, acho que conseguimos atingir um bom entrosamento que nos permite trabalhar e fazer coisas sem que a comunicação seja um problema fora do normal. A gestão dos sprints é feita com o Visual Studio Team Services, temos sprints de duas semanas.

Em termos tecnológicos, o sistema está todo assente em infra estrutura Microsoft Azure, estamos a usar os media services para o streaming, o Blob Storage para assets gráficos, o Azure Search para pesquisa e o SQL Server para base de dados. Há uma camada de serviços REST implementada com o ASP.NET WebAPI e a aplicação front-end é feita em AngularJS.

Como é a experiência de trabalhar em regime nearshoring?

O maior desafio tem sido o carácter volátil do sistema, por vezes estamos num sprint a alterar o que acabamos de implementar no sprint anterior. Coisas de startups

O facto de estarmos todos remotos é um desafio, não está ninguém aqui ao meu lado a quem possa simplesmente perguntar ou pedir alguma coisa. Por vezes temos perguntas que demoram horas a ser respondidas e às vezes só temos respostas 1 ou 2 dias depois, se for uma pergunta mais complicada para os membros americanos.

Desde que comecei o projecto, há 1 mês e meio, já tive oportunidade de implementar coisas que nunca tinha feito anteriormente, como a integração com o Azure Search ou os testes de carga do Visual Studio. Isso tem sido muito interessante.

E a vida no escritório da KWAN?

É um ambiente descontraído e alegre, um espirito de comunidade interessante. As condições físicas são muito boas e são pessoas que verdadeiramente se interessam umas com as outras. E há sempre bolos todas as semanas, não sei como não está já toda a gente obesa. Tem o ambiente alternativo a que estava habituado dos anos de televisão com a vantagem de estar rodeado de outros developers, coisa que sentia falta antes.

Por fim, de 1 a 10, quanto davas à barba do Rainmaker?

Apesar da idade jovem, já é uma barba respeitável com um grande potencial de crescimento. Diria um 8 por agora.

Awesome! Gostámos muito de te ouvir. Muito Obrigado Vitor!